jueves, 2 de septiembre de 2010

Presas por abortar? Logo serão livres!

Para Luz María Ramírez Villalpando, diretora do Instituto da Mulher de Guanajuato (IMUG), o melhor antídoto contra a violência doméstica são “três erres”. “As mulheres que são espancadas pelos seus homens, são aconselhadas a se resignar, rir e rezar”, explica Verónica Cruz, presidente do Centro Las Livres, associação civil que defende os direitos civis e reprodutivos das mulheres de Guanajuato, estado do interior da República Mexicana. Cunhada de Gerardo Mosqueda, secretário do governo estadual e segundo na estrutura local do Yunque, Ramírez Villalpando declarou há alguns dias que “as mulheres que fazem tatuagens são as principais responsáveis pela perda dos valores na nossa sociedade.

Em 2001, após a chegada de Vicente Fox à Presidência do México, o herdeiro ao trono estadual, Carlos Romero Hicks, subiu ao poder com os votos do PAN e a força da ONY (Organização Nacional do Yunque), uma poderosa seita secreta, que se encontra à direita da ultradireita mexicana. Durante o governo de Romero Hicks, as leis e políticas públicas ligadas à educação sexual e direitos reprodutivos foram alteradas para “harmonizá-las” com as idéias religiosas da nova administração, nas palavras de Verónica Cruz.

A educação sexual para os púberes e adolescentes foi praticamente excluída das escolas públicas e privadas. Eliminaram dos livros de ciências as ilustrações que mostravam os órgãos reprodutores masculinos e femininos, porque na opinião dos talibãs de Bajío “eles incitam a luxúria”. Esta organização lançou uma campanha permanente contra o uso de preservativos e demais métodos anticoncepcionais, baseado em outro dogma: para evitar doenças sexualmente transmissíveis e gravidez indesejada, a única opção que funciona é a abstinência.

Quando, em resposta aos protestos de vários setores do país, o “governo” federal proibiu o livro de ciências naturais editado pelo Yunque e exigiu que entregassem aos estudantes a edição feita pela Secretaria de Educação Pública, os Talibãs de Guanajuato queimaram-no numa praça pública de León, Guanajuato, lembra Verónica Cruz. Carlos García, um correspondente na região do jornal “La Jornada”, diz que, na opinião da diretora de IMUG, que não é médica e sim uma decoradora de interiores, “as mulheres, quando estão sendo estupradas, secretam um líquido espermicida que as protege da gravidez”. Não há dúvida de que por isso, nas paredes de Guanajuato, o slogan escrito entre os escudos e emblemas do governo estadual é constantemente repetido: "Por amor ou por violência, o aborto é um delito.”


Úteros assassinos.

No verão de 2004, uma pesquisadora do Instituto de Estudos Sociais (ISS) da Holanda, documentou na região da selva de Chiapas alguns casos de mulheres que sofreram abortos espontâneos devido à extrema pobreza na qual vivem. Este repórter obteve, pelo seu lado, os dados de mulheres que moram em áreas urbanas e gozam de plena saúde, mas sua gravidez foi interrompida involuntariamente entre o quinto e o sexto mês de gestação, porque elas possuíam "útero infantil", ou seja, um útero incapaz de alojar um feto em crescimento.

Na cidade de Guanajuato, desde 2001, abortos espontâneos por desnutrição ou qualquer outra limitação física, são punidos com até 35 anos de prisão. E aqueles que são voluntários também. Para os talibãs de Bajio são "homicídios por motivo de parentesco em detrimento de um produto em gestação", segundo o Código Penal em vigor no estado. Ou bem, como simplificou o governador Juan Manuel Oliva Ramirez numa entrevista publicada ontem pelo jornal La Jornada, são "infanticídios".

Apenas hoje, por esta acusação infame, cinco jovens camponesas acordaram sendo prisioneiras no Centro de Reabilitação Social (Cereso) de Puentecillas, na periferia da capital de Guanajuato, e outra em Valle de Santiago, perto de Michoacán. Todos estão cumprindo penas de confinamento de mais de um quarto de século. A “veterana” do grupo, com apenas 26 anos de idade, já está há nove anos na cadeia e ainda faltam dezessete, mas nenhuma jamais recebeu qualquer tipo de assistência médica, educação de saúde reprodutiva, nem ajuda para prevenir ou interromper sua gravidez. Uma delas ficou grávida na quarta vez que foi estuprada, sem conseguir que a polícia que a deteve pelo aborto pudesse protegê-la dos homens de quem foi vítima de maus-tratos por anos.

Além de serem vítimas de uma injustiça atroz e insuportável, todas elas têm em comum o fato de que, quando chegaram aos respectivos hospitais públicos pingando sangue e devastadas psicologicamente, passaram pela mesma surpresa antes de que fossem atendidas: os médicos que as atenderam na sala de emergência chamaram as autoridades competentes para denunciá-las "em flagrante delito."

Todas as seis, incluindo Alma Yareli Salazar Saldana, agora livre, passaram do hospital direto para a cadeia. Após serem condenadas, algumas delas apelaram ao Tribunal Superior de Justiça, mas por falta de bons advogados perderam em segunda instância e agora, para levar o seu caso à Suprema Corte, o lixo moral da nação, cada uma precisa juntar pelo menos 500.000 pesos (40.000 dólares) para contratar um advogado que queira representá-las: um sonho impossível, pois as suas famílias vivem em condições de pobreza extrema, e ocasionalmente visitam-nas quando conseguem os 400 pesos (30 dólares) que custa a viagem de suas comunidades para o Cereso de Puentecillas.

ONU vs ONY.

Por esse problema da distância, há poucos dias, na véspera da visita ao México da Alta Comissariada adjunta para os Direitos Humanos da ONU, a sul-coreana Kuyng-wha Kang, a Secretaria de Segurança Pública de Guanajuato forçou quatro das internas em Puentecillas a assinarem um documento pedindo para não serem entrevistadas pela imprensa. Qual a razão de um pedido tão absurdo, como se fossem a Angelina Jolie, Scarlett Johansson, Rachel Weisz e Natalie Portman cansadas dos paparazzi? Porque ameaçaram transferi-las para Valle de Santiago, um lugar que para suas famílias, que moram perto de Dolores Hidalgo e San Miguel de Allende, fica tão longe quanto para nós fica Iztapalapa de Nova York.

Agora que sabemos da sua existência e seu martírio –todas elas têm menos de trinta anos e têm uma vida inteira pela frente- não vamos permitir que apodreçam na cadeia. Primeiro de tudo, temos que fazer com que elas recebam, por todos os meios, mensagens dizendo-lhes que não estão sozinhas, e que não devem se resignar, rir ou rezar, mas sim continuar com a luta pelos seus direitos com a certeza de que, muito antes do que elas imaginam, voltarão a ser livres.

Desfiladero convida seus leitores -onde quer que eles estejam- a pensar, imaginar, organizar, dar forma e conteúdo, e lançar uma campanha nacional e internacional de solidariedade para a libertação imediata de Maria Araceli Camargo Juàrez, Yolanda Martinez Montoya, Ana Rosa Padrón Alarcón, Susana Dueñas, Ofelia Frías y Liliana Moreno. A campanha, naturalmente, deve ter como eixo o Centro Las Libres, cujas corajosas integrantes vivem e lutam em Guanajuato e precisam ser cercadas pelos braços de todos os homens e mulheres para sua proteção.

Atualmente, em Guanajuato há também mais de 166 mulheres que foram entregues à polícia pelos seus "médicos". Destas, 43 se encontram à disposição de um tribunal para serem submetidas a um processo criminal. Não se trata somente das seis jovens camponesas presas, ou daquelas que esperam sua vez na ante-sala do terror, mas sim de todas as mulheres do México e do mundo. Começamos a campanha? Admitem-se acessos, críticas e sugestões. Presas por abortar? Logo serão livres!

No hay comentarios:

Publicar un comentario